segunda-feira, 26 de maio de 2008


Nome: Catarina Malanho Semedo
Naturalidade: Nasceu em Fronteira, distrito de Portalegre.
Licenciada em Direcção Pedagógica e Administração Escolar e Mestrado em Ciências da Educação. Sempre ligada ao ensino confessa-se uma apaixonada da pintura e da poesia.
Obras publicadas: É co-autora de várias antologias e da colectânea Aragem Poética e é autora do livro Momentos Escritos e Coloridos.

Poesia


Acordem, Poetas

Não se deixem embalar
Por promessas que há no ar,
Lutem com as armas que têm
Dizendo tudo o que sentem
Deste povo, desta gente.
Não queiram ficar de for
Nestes tempos, nesta hora,
Que tudo está a ruir.
Nunca pensem desistir
Que um lugar vão conseguir
Com os vossos argumentos
Que falam de sentimentos.
Ajudem a acreditar
Aos tristes desesperados
Que serão recompensados
E àqueles cuja maldade
A todos tente enganar
Façam sentir que algum dia
Pelo dobro vão pagar…
Não vale a pena enganar!


Criança

Flor em botão
Que nasce sem querer
Sem ter o poder
De dizer que não!
E aceita sem jeito
Tudo o que lhe dão
Criança, escuta:
Tu que entras na vida
Num choro-promessa
De paz e amor
E trazes no riso o milagre da Cor,
O Eco-mistério da Criação,
Só tu consegues ainda
Mesmo a sonhar…
A imaginar…
Ter o Mundo na mão
Por isso sonha,
E canta Criança!
Que nós precisamos da tua Canção…


Catarina Malanho Semedo

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Florbela Espanca


Nome: Florbela Espanca
Naturalidade: Nasceu em Vila Viçosa, a 8 de Dezembro de 1894.
Filha ilegítima de uma "criada de servir" que faleceu muito nova. Apesar de ter sido registada como filha de pai incógnito, foi educada pelo pai e pela madrasta, em Vila Viçosa.
Estudou em Évora e mais tarde foi estudar para Lisboa, frequentando a Faculdade de Direito.
Através da sua poesia cultivou exasperadamente a paixão, no feminino como que a precipitar a emancipação literária da mulher.
Tornar-se-ia imortal através de uma poesia de desencantamento angústia e de solidão. O Alentejo e a paisagem alentejana estão, também, presentes em imagens e poemas.
Poesia
Horas mortas... curvadas aos pés do Monte
A planície é um brasido... e, torturadas,
As árvores sangrentas, revoltadas,
Gritam a Deus a bênção duma fonte!
E quando, manhã alta, o sol postonte
A oiro a giesta, a arder, pelas estradas,
Esfíngicas, recortam desgrenhadas
Os trágicos perfis no horizonte!Árvores!
Corações, almas que choram,
Almas iguais à minha, almas que imploram
Em vão remédio para tanta mágoa!
Árvores! Não choreis! Olhai e vede:
-Também ando a gritar, morta de sede,
Pedindo a Deus a minha gota de água!


Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!


Sonhos
Ter um sonho, um sonho lindo,
Noite branda de luar,
Que se sonhasse a sorrir...
Que se sonhasse a chorar...
Ter um sonho, que nos fosse
A vida, a luz, o alento,
Que a sonhar beijasse doce
A nossa boca... um lamento...
Ser pra nós o guia, o norte,
Na vida o único trilho;
E depois ver vir a morte
Despedaçar esses laços!
......É pior que ter um filho
Que nos morresse nos braços!

Se tu viesses ver-me...

Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços...

Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... o eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... os teus abraços...
Os teus beijos... a tua mão na minha...

Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri

E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...
Florbela Espanca

José Duro


Nome: José Duro
Naturalidade: Nasceu em Portalegre e viveu entre 1876 – 1899.

Poesia


EM BUSCA


Ponho os olhos em mim,como se olhasse um estranho,
E choro de me ver tão outro, tão mudado…
Sem desvendar a causa, o íntimo cuidado
Que sofro do meu mal — o mal de que provenho.

Já não sou aquele Eu do tempo que é passado,
Pastor das ilusões perdi o meu rebanho,
Não sei do meu amor, saúde não na tenho,
E a vida sem saúde é um sofrer dobrado.

A minh’alma rasgou-ma o trágico Desgosto
Nas silvas do abandono, à hora do sol-posto,
Quando o azul começa a diluir-se em astros…

E à beira do caminho, até lá muito longe,
Como um mendigo só, como um sombrio monge,
Anda o meu coração em busca dos seus rastros…


José Duro

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Ada Tavares


Nome: Ada Tavares
Naturalidade: Nasceu emem Odemira, a 5 de Novembro de 1930.
Tem muitos poemas sobre o Alentejo, um dos seus livros chama-se «Alentejo em Mim».

Poesia



O Alentejo é lá


É lá onde o Sol desce a violar

a terra provocante de nudez,

que emprenha uma e outra e outra vez,

de Sonhos, que já cansa de abortar...

É lá onde a Lonjura por lavrar

nem sombras a dividem lés-a-lés...

Só a noite a parcela e faz mercês

erguendo muros brancos de Luar.


E lá onde se chora de cantigano

embalar dolente a Dor antigaque,

desperta, se agita e faz ruim...
Onde há suor em bagas pela eira,

e esp'ranças crepitando na lareira,

- O ALENTEJO é lá ... e é EM MIM.

HOJE HÁ PÃO ALENTEJANO?

Esta frase tão ouvida
neste tom interrogado
não é sentença perdida
nem um pregão inventado,
nem dito voando à toa ...Oh senhores, mas quem diria
que eu ia ouvir isto um dia
aos balcões de Padaria
desta moderna Lisboa?!
"Hoje há pão alentejano?!"
E se o empregado diz:
-"Olhe, acabou de chegar."ri a freguesa feliz
e estende o saco apressada
pois não vá ele acabar ...e pede firme, sem graças,
que não pode haver engano:-"Ponha-me aí dez carcaças
e um pão alentejano".
Ai é vê-lo meus amigos,
este pão que era só nosso,
o nosso Bem de raiz
em pretensões, sem ganância,
como ganhou importância,
- como ganhou um País.Todos o querem agora,
por inteiro ... uma fatia ...
umas migalhas ... um naco
...Pão nosso de toda a hora
que é farinha doutro saco.
Venham vê-lo na Taberna
ou no fundo duma Adega
como alegra o camponês:
-ensopa o copo de três
-abafa raios e coriscos
-faz de cama prós petiscos
...e aconchegada a barriga
logo a voz se faz cantiga,
põe-se o Sol, vai-se a fadiga
que a noite mal começou,
e...'às quatro da madrugada
um passarinho cantou..."
Ó pão do meu Alentejo
que bela lição tu deste
na tua nobre humildade,
e como tu aprendeste
a usar fraternidade.?E sem briga, e sem guerra,
sem essa confusão louca,
deste nome à nossa terra,
levaste-a de boca em boca...
Pois também vai a banquete
se a solenes beberetes
nas salas bem afamadas,
posto assim em pedacinhos,
feito "tapas" e "entradas',
regado com os melhores vinhos.
É o mais requisitado,pedido
por encomenda,
e vai em naperons de renda
até à mão de ministros.
E deu no goto a estrangeiros
e a certos senhores bem vistos
que o acham uma riqueza
e o querem na sua mesa ...Não se recusa a ninguém, dá-se a ricos,
pobrezinhos, a crianças e a velhinhos
e aos doentes também.
Pão de Paz ! Pão de Alegria !
Pão de Amor! Pão de Verdade!
É como nós neste dia,
uma mistura sadia
de renovo e de saudade.
Ada Tavares

terça-feira, 13 de maio de 2008

António José Belo

Nome: António José Belo
Naturalidade: Montalvão, freguesia localizada extremo norte do Alentejo, distrito de Portalegre.
Nasceu a 25 de Junho de 1912 e faleceu aos com 90 anos, em Nisa.
Artesão, músico, apresentador de espectáculos, construtor de cenários e de peças de teatro, etnógrafo, um elemento muito activo em Montalvão. A sua poesia, as populares quadras e décimas tornaram-no poeta.


Poesia
O Botão de Rosa


Que lindo botão de rosa
Aquela roseira tem,
De baixo não se lhe chega
Acima não vai ninguém.

No muro de uma vivenda
Está uma jovem sentada
Prazenteira e descuidada
Comendo a sua merenda,
Usava saias de renda
A rapariga formosa
Mas era tão graciosa
E por baixo o namorado
Dizia entusiasmado:
Que lindo botão de rosa!

A jovem não reparava
Na testemunha indiscreta
Olhando o prado quieta
Com gosto a broa trincava
Mas o rapaz que olhava
E analisava também
Os encantos do seu bem
E murmurava baixinho:
Olha que tanto espinho
Aquela roseira tem!

Por fim a mocinha linda
O rapaz intruso viu
Mas disfarçou e fingiu
Não o ter topado ainda
A merenda estava linda
Mas ela não se conchega
Entre a posição de pega
Ele diz todo airoso:
Aquele botão formoso
De baixo não se lhe chega!

Ela ouviu isto e com ronha
Sorrindo pouco se ensaia
Ainda mais ergueu a saia
Fingindo não ter vergonha
Numa enrascação medonha
O rapaz cora, porém
Ela o riso não sustém
E olhou para baixo trocista:
Goza meu amor com a vista
Mas acima não vai ninguém!


António José Belo

António Simões


Nome: António Simões
Naturalidade:
Beringel, concelho e distrito de Beja
Nasceu a 29 de Novembro de 1934. Licenciou-se, pela Universidade de Coimbra, em Filologia Germânica.



Obras publicadas:
"Soneto de Água" (1994);
"A Festa das Letras" (1995)
"Minha Mãe Amassa o Pão" (2001).
Tem poemas publicados em diversos jornais e revistas.
Está representado na antologia Poetas Alentejanos do Século XX (1984) e é colaborador da Revista Rodapé da Biblioteca Municipal José Saramago de Beja.



Poesia
Excerto de “Minha Mãe Amassa o Pão”


"Minha mãe amassa a vida,

E a vida cabe-lhe inteira

Na farinha desmedida,

No infinito da peneira.




Minha mãe amassa o dia,

No alguidar, sobre o banco,

E do forno da alegria

O pão loiro sai tão branco.




Minha mãe amassa o ar,

Duma leveza infinita

Quando fica a levedar,

A massa inteira levita.




Minha mãe amassa as flores,

As que no campo se dão

E há mil cheiros, mil sabores

Numa fatia de pão.




Minha mãe amassa e diz

Pra dentro do coração,

Que só pode ser feliz

Quando os outros também são.




Minha mãe amassa o verde

Duma seara de trigo

Vais matar-me fome e sede,

Alentejo, eu te bendigo!”

António Simões